sábado, 28 de fevereiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (VI)
dorsal versus ventral
[desconforto]
dúvida irascível na escolha do posicionamento
estrebuchar no solo frio da cerâmica
superfície vertical individualizada
irregularmente cilíndrica, ideal para abandonar bifurcações
e dar azo a vontades de pé
comprometendo caprichosamente directivas do pensamento
– um refúgio tridimensional: os pés no caminho frágil
ângulo negro:
de lambidela em lambidela
uma família de gatos subjugada pela ampulheta
testemunha o êxtase do tacto num abrir de telhas – o tecto
desabrocha na noite
as madeiras rangem recados
códigos sobressaltados do relâmpago
um único feixe vindo do berço perpetua-se
pelo contínuo estilhaçar de flashes
génese dum monólogo invariavelmente audível
os gatos agridem a radiação na explosão dos nós
rosnam enfraquecidos pela luz que lhes fere os olhos
exaustos adormecem no gás da almofada
no centro da espiral de fumo
dança a trança de pêlos negros
[oferenda dos bruxos]
hoje é sexta-feira treze
cumprem-se os votos da sacerdotisa virgem
a lua entregue ao bel-prazer dos gatos virtuais
garras a escavarem um écran
– procurar no berço a ponta do feixe
onde residem significados do arbítrio
camuflados pela cor electromagnética dos sons
a ampulheta tosse
[rio de pânico subindo a tristeza refractada na cor]
uma mão divina colhe miados no labirinto impaciente
una pulsação da família em coro desprotegida
e o tempo escorre ainda mais frenético
os gatos petrificam-se um a um
– despedem-se do rosto frio e branco da lua
que aperta, entre lágrimas, o seu xaile
sábado, 21 de fevereiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (V)

o coração sobrevém embriagado sob o tronco do qual sairá
uma guitarra que arrematando as cordas
o aprisionará
ângulo roxo:
a cobra enrodilhada no lagar
pariu treze filhas
e na expectativa da forquilha próxima
revê a superfície luzidia de todos os bagos de uva
janelas dum ciclo a confessar efemeridade
carisma do vinho a cair no copo, o descerrar
das escamas
os frutos falam de amor, delírios de quem
os come – e o tempo diz do néctar que neles habita
tingidas pela chuva as sedas
desmaiam nas imagens, enfraquecem o vinho
o afago
aos glóbulos vivos em ânsia despropositada
porque há arte em acender polpas
e muito se aprenderia se possível fosse
auscultar os mortos
na loucura de cada gomo – eterna espera
sedutora glicose escondida nas abóbadas do fruto
pulsar dos vértices, arquitectura do palato
atento
morrer e ressuscitar num segundo
brincadeira de língua
e quando a guitarra eleva o etanol
a voz tropeça na alegria aninhada nas veias
nesse encanto
o miocárdio entende porque
cantam as maçãs, as peras, as laranjas
nos pomares
– pulmões inundados pelo sumo
jorro feliz
basta uma garganta no platinado das sombras
uma fogueira que arda o mosto
[descuidado pela cobra subtraída ao lagar]
basta uma garganta que se implante numa tarde visionária
mordida pela embriaguez da saudade
e assim se estanca a solidão na cratera aberta
pela volatilidade das cordas, pelo casamento da voz
com a música
sábado, 14 de fevereiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (IV)

a alma reposiciona-se na qualidade de diafragma
espera víveres do holofote
ângulo amarelo:
os mortos reconhecem-se na difusa luz
[centelha do suspiro]
unem os ossos no descampado
dão as mãos
[súplica do húmus tenro]
circundam os que vivem, cotejam poder a cânticos
– cadáveres à solta na garganta dos vivos
da ceifa ficaram esqueletos para herdeiros instrumentarem
à terra o fundo da circuncisão maior
dádiva completa de passagem em passagem
um diálogo com a legítima mãe
um forno húmido de crispações
suplantado pela piscina do ódio, lago de sombras
o ermo alimenta-se de episódios de amor mal resolvido
um horto de flores a haver:
girassóis transfigurados
tulipas descomunais albergando sanguessugas nas corolas
glicínias produtoras de minúsculos dardos venenosos
magnólias com ventosas musculadas
dálias carnívoras
o reinado da reestruturada dinâmica de fluxos:
sangue a subir o xilema
vómito a descer o floema
plantas com grandes olhos
o pesadelo, endereço dos mortos
– rótulas vegetais impulsionam canos
caules grossos
ligados ao contentor de açúcar
pólen saturado que as veias pingam
caroços químicos invasores
vírgulas no genoma – a alma dorme, consente
a derradeira posição do holofote
dentro da raiva que rege a estratificação do solo
a consciência do petróleo
o cheiro nauseabundo da abundância caótica
convertido em suor na espécie molestada
e os mortos brincam às marionetas com as plantas mutantes
ensimesmados no azar que lhes convêm
cumprem na entropia o teatro do ódio, a crueldade cénica
uma vida já extinta
espera víveres do holofote
ângulo amarelo:
os mortos reconhecem-se na difusa luz
[centelha do suspiro]
unem os ossos no descampado
dão as mãos
[súplica do húmus tenro]
circundam os que vivem, cotejam poder a cânticos
– cadáveres à solta na garganta dos vivos
da ceifa ficaram esqueletos para herdeiros instrumentarem
à terra o fundo da circuncisão maior
dádiva completa de passagem em passagem
um diálogo com a legítima mãe
um forno húmido de crispações
suplantado pela piscina do ódio, lago de sombras
o ermo alimenta-se de episódios de amor mal resolvido
um horto de flores a haver:
girassóis transfigurados
tulipas descomunais albergando sanguessugas nas corolas
glicínias produtoras de minúsculos dardos venenosos
magnólias com ventosas musculadas
dálias carnívoras
o reinado da reestruturada dinâmica de fluxos:
sangue a subir o xilema
vómito a descer o floema
plantas com grandes olhos
o pesadelo, endereço dos mortos
– rótulas vegetais impulsionam canos
caules grossos
ligados ao contentor de açúcar
pólen saturado que as veias pingam
caroços químicos invasores
vírgulas no genoma – a alma dorme, consente
a derradeira posição do holofote
dentro da raiva que rege a estratificação do solo
a consciência do petróleo
o cheiro nauseabundo da abundância caótica
convertido em suor na espécie molestada
e os mortos brincam às marionetas com as plantas mutantes
ensimesmados no azar que lhes convêm
cumprem na entropia o teatro do ódio, a crueldade cénica
uma vida já extinta
sábado, 7 de fevereiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (III)
vectores do sangue lardeados pelo som da constrição
de paredes
partículas arrancadas ao domínio obscuro
– a força inerte
beleza do betão enquanto paisagem
ângulo violeta:
a mulher desconstruída em triângulos
desolada atravessa oblíquas dimensões do horror
chão em pesadelo
abismo de porta em porta
o som bastante sujo
a mulher desdobrada no que de seu perde
em truculentos rearranjos
figurações hediondas do amianto
sempre hesitante em qualquer maçaneta-chifre à sua frente
uma casa desarmada em flor bebe o arco-íris
pela aorta
engole fraccionadamente a mulher
que contrariada respira ar de brita
nariz contra o espelho – foz errada
beijar inverso:
planos côncavos deterioram outros convexos
frivolidade das arestas, a mulher invertida
a alienar uma epiderme mais espessa
que de estranha deixa corroê-la
pela borrasca intestinal
febre do stress
anjo-reflexo
faminta regressão hipnótica: a máscara consubstancia-se
tal a fúria calcária
e incha, incha até subsequente fractura
o grito – a mulher reconstrói-se
ergue-se no nervo óptico
sai da agrura do humor vítreo para o alívio do cristalino
insinua-se na pupila
floresce na íris
alumia o humor aquoso
desarma a córnea
vê
sábado, 31 de janeiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (II)
ponto a ponto o espaço é desvendado pelo clarão
aquilo que é iluminado e curvo
porque a luz resguarda órbitas fenomenais
e os corpos alcançam significados pelo toque da iluminação
unos e tremendamente sós – no santuário
as velas choram um leite puro
quente, inocentemente amamentam
os seres que se movimentam na escuridão
ângulo verde:
o baile funesto de saprófitas, crescente miséria dos povos
ejaculação política num colorido envenenado
terreno inóspito, sem dúvida, e anda o indivíduo
a treinar as mãos na saca de grãos vinda do desespero
pobre coitado – ainda se aleija no veneno
o pão que a sociedade reveste de cívico no falar humano
cheio de pústulas e de magnetismo perturbador
simboliza a sucessão ininterrupta de blocos
imprevisíveis no âmago
mas capazes de gerarem um buraco negro
e criarem a falsa ilusão de consumarem nobre ofício:
o de esculpirem identidades
procura e oferta, hierarquias no esvair da matéria
e um amor de cinza acabado
nuns lábios por arder
somente um incorruptível prodígio na visão da criança
num êxtase raro
e talvez irrepetível na sua vida:
uma família numerosa reunida à mesa
empenhada a comer frutos secos no epílogo da consoada:
nozes, amêndoas, avelãs
mandíbulas, maxilares, dentes
ranger de cascas
o ruir dos tecidos
vultos compenetrados
a música orgânica
ritual de dentro
– o silêncio do arvoredo linguístico
aquilo que é iluminado e curvo
porque a luz resguarda órbitas fenomenais
e os corpos alcançam significados pelo toque da iluminação
unos e tremendamente sós – no santuário
as velas choram um leite puro
quente, inocentemente amamentam
os seres que se movimentam na escuridão
ângulo verde:
o baile funesto de saprófitas, crescente miséria dos povos
ejaculação política num colorido envenenado
terreno inóspito, sem dúvida, e anda o indivíduo
a treinar as mãos na saca de grãos vinda do desespero
pobre coitado – ainda se aleija no veneno
o pão que a sociedade reveste de cívico no falar humano
cheio de pústulas e de magnetismo perturbador
simboliza a sucessão ininterrupta de blocos
imprevisíveis no âmago
mas capazes de gerarem um buraco negro
e criarem a falsa ilusão de consumarem nobre ofício:
o de esculpirem identidades
procura e oferta, hierarquias no esvair da matéria
e um amor de cinza acabado
nuns lábios por arder
somente um incorruptível prodígio na visão da criança
num êxtase raro
e talvez irrepetível na sua vida:
uma família numerosa reunida à mesa
empenhada a comer frutos secos no epílogo da consoada:
nozes, amêndoas, avelãs
mandíbulas, maxilares, dentes
ranger de cascas
o ruir dos tecidos
vultos compenetrados
a música orgânica
ritual de dentro
– o silêncio do arvoredo linguístico
sábado, 24 de janeiro de 2009
PSICOCLAUSTROFONIA (I)
espreitar o universo e vê-lo obscuro
intensamente desfocado: os habitantes dos planetas
defecam atmosferas de gás, gritam pequenez
cada um vê-se como um asteróide negro desabitado
– o processo de desertificação é interior
e fruto do olho humano
ângulo vermelho:
entra a rainha do submundo
uma labareda de cabelos ruivos
um vestido de pólipos folhosos e fumegantes
[rubro contra púrpura]
momentos antes da prédica no púlpito do sacrário venal
intensifica-se o desfile, o crepitar da coroa
– a assembleia inicia a descompressão da pepita
alguma poeira cósmica, dialectos absurdos
ângulo intersectado – a linha fúnebre, bastarda
a luz azul, um rosto frio
visão de cima: um palácio de tijolo sanguíneo
velado por mutantes da palavra obscura
suplício dos guerreiros infelizes
no interior
em câmara resguardada de festejos mundanos
e diálogos triviais
a laranja velha repousa no luxuoso caixão do mundo
seus horrendos poros tossem vermes gordos
embriões da desgraça, outrora vísceras em papa
lembrança da perpendicularidade
a todos os olhos nua
fria
e inalterável
comecemos então
o novíssimo estratagema da criação: células
prestes a asfixiarem
num quarto de vidro gravemente embaciado
– vapor de melaço
saído das entranhas do cientista
escapando à anatomia do vergonhoso cérebro
rasga-se
com a maior unha do corpo
o útero do pensamento mais escondido
dito recalcado – espera-se muco
e algum sangue podre
esporadicamente a ciência visita o campo da adivinhação
– quando o cientista, um pouco bruxo, aguça a lente
para destrinçar emaranhados colossais da massa a analisar
entra num fino véu
mesclado de nácar e fel
consumando-se o milagre das sete abóbadas
contentem-se os artesãos da ciência
com aspectos elementares da laranja morta
velha rainha
pois nunca desvendarão trilhos que
alguma vez
os cavalos do ácido traçaram
quarta-feira, 14 de janeiro de 2009
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